Por Evelyn Weck*
Disse Nicolau Maquiavel: “O inovador tem seus inimigos naqueles que foram bem-sucedidos no antigo sistema e defensores entre os que podem se dar bem na novidade”. Essa foi a conclusão a que o filósofo italiano chegou há mais de cinco séculos, durante o período histórico conhecido como Renascimento, considerando o contexto socioeconômico da época. A frase não poderia ser mais atual, considerando o acelerado estágio de ascensão do desenvolvimento tecnológico, em que transformações exponenciais, em todos os seguimentos, acontecem em um curto espaço de tempo, rompendo com padrões tradicionais e com o fluxo natural de um processo.
Recentemente, na década 1990, Clayton M. Christensen, professor da Harvard Business School desenvolveu a teoria da inovação disruptiva, ao realizar pesquisas sobre a indústria do disco rígido. O professor define inovações disruptivas como processos que provocam uma ruptura no antigo modelo de negócios, pontuando que o fenômeno favorece o aparecimento de novos entrantes.
O fenômeno da inovação disruptiva se popularizou com a chegada de Empresas como Apple, Facebook, Google, Uber, Airbnb, Spotify e Netflix, em sua maioria concebidas no ecossistema das startups.
Todas essas organizações têm em comum o seguinte: conseguiram se afastar dos modelos consolidados no mercado, ofereceram soluções inovadoras e, por isso, promoveram profundas transformações nos seus seguimentos e significativos impactos na cadeia de consumo. As empresas que operavam no sistema antigo, naturalmente, perderam mercado e se tornaram obsoletas. A disrupção, portanto, é o resultado da combinação de inovação de modelos de negócios e tecnologia.
A trajetória das dinâmicas disruptivas, alcançou o tradicional campo do Direito. Pelo viés da regulação jurídica, cita-se alguns regulamentos a respeito de novas tecnologias: Lei n.º 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), Lei n.º 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) e o Decreto 9845 (Plano Nacional da Internet das Coisas).
A presença das novas tecnologias computacionais já pode ser percebida, também, pelas profissões jurídicas e, muito em breve, a maneira como o serviço é prestado será completamente diferente.
O crescimento global do mercado das Lawtechs e Legaltechs (empresas que desenvolvem tecnologias para o meio jurídico) é a prova de que muitos escritórios de advocacia estão preocupados com os impactos decorrentes do avanço tecnológico e, por isso, querem se adequar. Recentemente, o Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação – CEPI da Fundação Getúlio Vargas, realizou uma pesquisa a respeito do futuro das profissões jurídicas¹, concluindo que as transformações tecnológicas cond#_ftnuzirão à formação de grupos colaborativos multidisciplinares dentro das organizações, intensificando o diálogo entre profissionais do direito e das áreas técnicas. Foi constatada a necessidade de aprendizagem, pelos advogados, de noções gerais de programação, estatística e matemática e de formação em administração de negócios e processos. Nesse cenário, ganham destaque os “profissionais híbridos”, com formação jurídica e domínio em linguagem de programação, que se dediquem a codificação de soluções. A pesquisa registrou que não é possível afirmar que o processo de transformação impactará a todos os profissionais, mas evidenciou um fato: os juristas do futuro desenvolverão habilidades de programar e treinar máquinas computacionais.
É a nova advocacia 4.0, que conecta a inteligência humana à artificial para se chegar a um resultado mais rápido e eficiente. Nesse novo modelo de negócios jurídicos, auxiliados pelas novas tecnologias para a realização de tarefas de menor complexidade – por seu caráter repetitivo, ou por não exigir domínio profundo de conhecimentos jurídicos -, os advogados poderão dedicar a maior parte do seu tempo ao desenvolvimento de questões jurídicas complexas.
No âmbito dos Tribunais, um bom exemplo do processo disruptivo é o robô Victor, do STF, que tem a função de organizar e agilizar os andamentos dos processos, realizando tarefas rotineiras que antes eram realizadas exclusivamente por humanos.
A mudança é uma certeza e as organizações jurídicas têm o desafio de criar soluções criativas e inéditas diante dos fenômenos que se apresentam. Além do desenvolvimento de novas habilidades no que se refere ao conhecimento e uso da tecnologia, a mudança necessária é comportamental, é do mindset dos operadores do direito que, sabendo usar a inteligência artificial seu favor, encontrarão uma aliada.
*Evelyn Weck é Sócia e Advogada no Escritório WYBL, formada em Direito pela PUC-PR e com especialização em Gestão de Direito Empresarial pela FAE.